Uma luz fraca pendia sob o teto da sala, mal-iluminando o livro aberto e as palavras escritas a lápis no canto do texto. Tratava-se, creio eu, de um livro de cálculo, já gasto pelo tempo, com a borda das páginas acumuladas de poeira e um cheiro amarelado de folha seca. A sala era vazia: não comportava muitos móveis, apenas um sofá azul para duas pessoas, uma mesa redonda de madeira de plátano e duas cadeiras cujo estofamento estava rasgado; no canto esquerdo perto da porta, uma pilha de livros encostados na parede. As meias cinzas ainda descansavam no centro do cômodo. Parecia que o costume a impedia de se abaixar e recolhê-las, já que estas não haviam mudado de posição nos últimos meses. Talvez, se fossem guardadas, levariam consigo parte daquele lugar, onde passavam-se tão agradáveis horas rindo de coisa alguma.
Do outro lado da parede, a louça encontrava-se lavada pela primeira vez e a cozinha não convidava aqueles bem-aventurados a se retirarem correndo em busca de um ar respirável. Podia-se ver o chão e caminhar com tranqüilidade, sem aquele medo de pisar em algo que, em seguida, viesse a esfarelar-se. Respirou fundo, pela primeira vez, e deixou um teimoso sorriso de satisfação rabiscar-lhe o rosto corado.
Voltou para a sala vazia e sentou-se em seu lugar de rotina. Olhou em volta, como se à espera de alguém e, rapidamente, sentou-se no lugar dele. Sentia-se bem agora, vendo a mesma cena de antes só que disfarçada de outros olhos.
Lembrou-se do primeiro dia, daquela ansiedade de julgamento e do medo de uma nova decepção. Lembrou-se do segundo dia, da ansiedade da espera, do medo sem motivo. Tornou-o cúmplice de sua vida e ouvinte de seus desgostos. Fez do seu amor um amigo, do seu sorriso uma saída. Chorou em voz alta sua bronca com o que não é da alma do ser humano até o momento em que se cansou do lugar comum em que se encontrava. Era feita de vidro, sabia disso, e a ele não enganava.
Estava adiantada. Ainda faltavam minutos para ele voltar. Sentou-se novamente no seu lugar e pôs-se a ler o que havia começado. Embora não houvesse poesia naquelas palavras, ela gostava do fato de transbordarem no hálito que as carregava.
4 comentários:
uma prosa.
não tão boa quanto as do Maurício.
uma prosa que não é minha, finalmente. gostei!
e a sua é melhor do que as minhas, mesmo.
geeeeente
Plátano é a árvore da folha da nossa escola!
sabe? aquela bonitinha que tem no uniforme...
acho que eu escrevi com minúscula no texto. peço perdão.
não precisa se sentir mal por uma árvore de Maple (ou Plátano, que seja)...eu corrijo, se precisar
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