sábado, maio 19, 2007

O Céu Esmagador (O Fim Urbano de uma Lenda Não-Urbana)

Agora dissolvia as copas das árvores a escuridão, por sua vez dissolvida pelo sol artificial, que as devolvera do céu esmagador. A noite, que libertava e drogava, sufocava a lua que o guiara. Nada mais lhe pertencia, desde que a lua fora dissolvida junto às copas. Culpava o falso sol e a profundeza criados por seus semelhantes por reprimirem sua dor selvagem. Não sentia o que o mordera, a saliva que o corroía. Pensava apenas em sua guia...

O pretenso dia fê-lo parar diante do rio duro e profundo, que não lhe permitiria mergulhar ou alucinar. Não havia ilusão, somente o plano, preto e branco, que rasgavam seu couro. E então a escuridão dissolveu as copas, os troncos e as raízes e a besta, tomando-as para si.

segunda-feira, maio 07, 2007

Poema pra jogar fora

De um só golpe
olhos reviram.

De fundir-se a outrem
de um só golpe.

De ser plural no singular,
apenas.

A duras penas.

De ser cara, ser coroa,
cetro e manto.

De reinar em dois seres,
e ser súdito.

De um só golpe,
tornar-se súdito.

Ser o devir.
Tê-lo sido.

De um só golpe.

***

Eis que apareço, com demoras (desculpas ao senhor Tigermoth).
Espero ser útil.


Ass.: Werke ohne Opuszahl

quinta-feira, maio 03, 2007

A Rua

Em seu movimento próprio
inspira, expira devagar.
Palpita sob nossos pés
sob o pneu dos carros
e o tropeçar dos bêbados
Se move num fluir sólido. Secular
Só-
lido
Silencia, muda, embaixo do barulhar
tropêgo dos carros.
Se revolta, mimada, no esburacar
Chora, inabalável, no ir e não voltar.

A rua de pedra
brita que palpita, grita
piche suor seco
Alameda avenida viela
de toda a gente
Só-
lida
Incógnita concreta
fluido onipresente
rua
por nós intransponível, quieta
por nós incompreensível, serena
Tua
Rua
Nua.

Luiz Felipe, 02/05/2007.